quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

Desconstruindo

Acho que deu pra perceber no post anterior que ainda tenho muita coisa pra mudar. Conceitos, opiniões e muito mais. Brothers, foram mais de 20 anos construindo uma muralha para me proteger do perigo, do monstro. Há poucos dias um abalo ocorreu no meu reino. Um tremor que causou rachaduras em minha muralha de proteção. Fiquei como o cara que fica parado em frente a uma avenida movimentada, vendo os carros passarem e ele ali, parado e estático. Não sabe se vai, pra onde vai ou se volta. Fiquei vários dias sem horizonte, sem chão. Até que decidi que era hora de desconstruir a muralha. É difícil derrubar um trabalho de anos mas estou fazendo isso e descobrindo um novo mundo, novas pessoas e novos amigos. E preciso da ajuda destes novos amigos, vocês. Tenho conhecido (pelo MSN ou pelo blog) pessoas incríveis, com uma visão de mundo diferente do que estava acostumado, homens inteligentes e sensíveis com histórias e experiências de vida que quero conhecer. Sim porque é através desse intercambio de idéias que consigo reconstruir minhas estruturas. E acho que até pareço chato às vezes, de tanto que pergunto as coisas, interessado nos detalhes das histórias. Quero discernir o que posso e o que não devo fazer. Por exemplo, teclando no MSN com um brother blogueiro soube de uma história que me deixou pertubado. O brother estava teclando com um cara que tinha uma situação parecida com a minha (casado e com filhos). Ele estava desesperado, não sabia o que fazer diante da encruzilhada que estava - a mulher/filhos vs. desejo por homens. Estava decidido, naquela noite, de cometer suicídio. Nosso brother ainda tentou argumentar com ele, mas em vão. Se fez o que disse que faria não sabemos. Mas daquela noite em diante ele não foi mais visto on line no MSN. Essa história me arrepiou, porque eu senti a angustia dele, o desespero de não saber o que fazer. E reforçou minha convicção daquilo que não quero fazer: a solução fácil e extrema do suicídio.
Por isso, comente o que quiser. Critique o que não gostou. Elogie se achar que deve. Comente. E se quiser falar comigo no MSN me dê um toque.

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2007

Sotaque?


A revista Superinteressante do mês de fevereiro trouxe uma matéria (página 36) que me fez pensar. Debaixo do título “Gay tem sotaque próprio?”, mencionou-se uma pesquisa feita nos EUA que fazia parte de um estudo de uma universidade. Em parte dizia o seguinte: “O estudo aponta que as lésbicas anglófonas produzem menos o som frontal ‘u’ do que mulheres héteros, e que as vogais faladas pelos homens gays são mais esticadas. Voluntários que participaram do teste não tiveram dificuldade em identificar diferentes orientações sexuais apenas pelo som da voz.” Um psiquiatra que participou da pesquisa concluiu: “A fala dos homossexuais é diferente. Ela mistura características dos dois sexos. A das lésbicas é mais masculina, e a dos homens gays é mais feminina.” A matéria na revista concluiu também que nada é conclusivo e blá blá blá, blá blá blá. Mas dá o que pensar não dá? Vocês já olharam para um cara, prestando atenção no jeito dele, na maneira de falar e concluíram, como já aconteceu comigo: “esse cara leva jeito; acho que ele é do lado rosa da Força”? O contrario também acontece. Já ouviu comentários a seu respeito duvidando da sua “masculinidade”? Aconteceu comigo em mais de uma ocasião. Por exemplo, recentemente, em um emprego anterior, um colega de trabalho me disse que ouviu um comentário feito por uma garota (lésbica assumidíssima) sobre mim. Ela disse para ele:

- “Esse cara, não me engana. Falta só um empurrãozinho pra ele vir pra luz”.

Brothers, fique encucado. Encucado e aterrorizado. Porra, será que eu tô dando bandeira e não percebo? Eu não faço o tipo afeminado, muito pelo contrário, procuro parecer o mais normal hétero possível. Nada contra quem assumiu sua condição e demonstra isso publicamente (queria eu ter essa coragem). Só que não sou assim. Ainda não desamarrei totalmente minhas amarras pra assumir publicamente o que sinto. Tenho muita pedra ainda pra desviar, mas sei que comecei a andar. E sei também que tenho companhia nesse caminho. Uns andam mais depressa. Outros, mais devagar (esse é meu grupo). Mas todos nós avançamos, em diferentes velocidades, mas avançamos. Agora, ser apontado como “gay”, tenho pavor disso. Não gosto de ser identificado com essa palavra. Na minha opinião ela assumiu uma conotação pejorativa na mídia, aquele tipo cômico que insistem em colocar em programa de humor, novelas e filmes, do cara afetado, que desmunheca, que se veste no estilo espalhafatoso. Prefiro a palavra “bissexual” que traduz melhor a nossa realidade (a minha pelo menos). Posso estar sendo preconceituoso. Posso até um dia ter orgulho de ser chamado gay. Não sei. Mas hoje isso me leva a um ataque de pânico. Depois do comentário da nossa amiga sobre mim, é desnecessário dizer que liguei o módulo de camuflagem na força máxima, né? (é claro que não sai por aí cuspindo no chão, conçando o saco toda hora ou mexendo com a mulherada na rua chamando-as de gostosa, aí já é demais; como disse o Lobão: Decadence avec elegance).
Que vocês acham? É possível mesmo identificar no meio da multidão pessoas como nós, pela maneira de falar e se portar? Já passaram por situações assim?

sábado, 24 de fevereiro de 2007

O Blog
"Nenhum espelho reflete melhor a imagem de um homem do que suas palavras."
Por que escrever um blog? Por que expor meus sentimentos e minha vida, mesmo que seja no anonimato virtual? Senti necessidade disso, falar o que sou e o que sinto para outros (fiz isso uma vez com um amigo hétero, mas isso será tema de um post). Como já disse no meu primeiro post, fui muito ajudado por ter lido outros blogs, de homens com situações iguais a minha. O primeiro deles foi o blog do Brother (Dúvidas de um bissexual de 30 anos). O tema da bissexualidade me interessou e lá fui eu para o blog. Quando vi que não tinha fotos pensei “cadê os machos,que saco!”. Mas quando li alguns títulos de posts e depois os textos – eram minhas dúvidas que estavam ali! Consumi desesperadamente tudo, com olhos marejados e coração apertado. Era o inicio da revolução em mim. Vi links para outros blogs que também foram devorados.Blogs que levavam a outros blogs. E aqui estou, escrevendo o meu blog. Talvez com o objetivo de ajudar um brother que seja, como aconteceu comigo, ou talvez fazer minha terapia particular (no blog do Breno, o Buraco Existencial, ele disse que Freud comentou que escrever é uma forma de terapia, não custa tentar né?). Enfim quero materializar meus sentimentos. “Ah, cara não fala bobeira, vc tá viajando”, talvez alguns digam. Mas já notou que todas as pessoas tem dúvidas uma hora ou outra na vida? Especialmente nós somos assolados por esse mal. Alguns de nós têm dentro de si redemoinhos de dúvidas; outros tem um furacão nível 5 de incertezas. Mas quando você olha pra dentro de si, encara suas dúvidas e sentimentos e os transforma em letras e palavras, eles passam a ser manipuláveis, você os vê ali na sua frente. Você se auto-descobre, vê o desenho de seu interior. E é interessante que estes sentimentos-transformados-em-palavras criam ou despertam naqueles que os lêem, sentimentos também: desprezo (“que viadice da porra!”), indignação (“isso é falta de macho!”), tédio (“porque eu tô perdendo tempo lendo isso?”), piedade (“tadinho, que situação!”), afeição (“snif, snif”), empatia (“caraca, é isso que tô sentindo!”) e outros. É meus amigos, é o poder das palavras!!

Agora alguns comentário sobre o blog. Não faz parte do projeto original do blog postar fotos (aquelas fotos da maravilhosa anatomia masculina!!), mas não quer dizer que eu não vá colocar, quem sabe? Deu pra perceber meu estilo de escrita: frases entre parênteses, aspas, comparações e citações. Gosto de escrever assim, uma colcha de retalhos, amarrando as palavras, trançando as informações. Tem gente que não gosta de citações, eu sei, frases feitas, clichês. Mas eu digo uma coisa: “Sei que às vezes uso / Palavras repetidas / Mas quais são as palavras / Que nunca são ditas?” (Quase sem querer, Renato Russo, meu hino)

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007

O início

Há mais de 100 anos, o escritor inglês Robert Louis Stevenson escreveu o romance “O Médico e o Monstro”, no qual nos é apresentado o médico Dr.Jekill, homem de conduta exemplar, respeitado, gentil e educado, que através de uma experiência liberta seu alterego – Mr. Hyde - uma criatura que estava reprimida dentro de si, instintiva, sexual, irresponsável, um monstro. Você já deve ter visto este tema – a dupla personalidade - em outras obras na literatura, nas histórias em quadrinhos ou no cinema como por exemplo o Lobisomem, Batman/Bruce Wayne, Hulk/Bruce Banner, Superman/Clark Kent. Homens com 2 personalidades, distinta e opostas entre si ou não, mas que durante um tempo uma prevalecia e a outra era dominada. Não isso não é uma análise literária ou coisa assim, mas essa alegoria, o médico e o monstro, Dr. Jekill e Mr. Hyde, simboliza bem o que sentia, o que vivia. Duas pessoas: uma o exemplar, responsável e comedido homem acima de qualquer suspeita; a outra o desviado, irresponsável e sexual homem que sente desejos proibidos por outros homens. Assim como Dr. Jekill, o mesmo sentimento de repulsa, nojo e arrependimento cada vez que me deixava dominar pelo monstro, que satisfazia seus desejos pervetidos. Um sentimento de desprezo por mim mesmo, de vergonha pelo que fazia (não ficava fisicamente com outro homem, só o “prazer solitário”), de nojo que durava um tempo e logo após - olha os desejos reprimidos e escondidos se manifestando novamente! Desesperadamente faria tudo para me livrar desse monstro dentro de mim. Mas isso começou a mudar recentemente.
Já nadou em um rio de forte correnteza? Você nada lutando para não ser levado pela força da correnteza, desesperadamente se esforçando para não ser vencido; sem nada para se agarrar, sem galhos, bóia, corda ou alguém para lhe ajudar. E o tempo vai passando; você grita, berra, ora a Deus por ajuda, mas ninguém aparece para lhe salvar. Está só e você vai se cansando e a correnteza do rio constante e até mais forte. Uma hora você para de nadar contra a força da natureza, exausto pelo esforço, sem força para continuar tentando. E se deixa levar pelo rio. Se deixa levar pela natureza, sem saber o que irá acontecer, aonde vai chegar. Apenas tomando o cuidado de desviar dos obstáculos que poderão feri-lo.
Algo assim aconteceu comigo. Anos de luta contra o desejo “pervetido”, mas ele não desaparecia. Continuava a me dominar por mais que me esforçasse. Gritava desesperadamente por ajuda e nada mudava. Até que, na internet, comecei a ver que assim como eu, havia outros homens que viviam uma situação igual. Nos vários blogs que li, vi sentimentos semelhantes, angustias idênticas, iguais temores. Vidas escondidas, secretas, subterrâneas que sofriam como eu por ser diferente do padrão de macho/hétero. Eram homens que libertaram o escondido, jogaram fora as fantasias e máscaras e viviam o que realmente eram (muitas vezes pagando um alto preço por isso). Já outros continuavam com sua dupla vida, escondendo de todos o seu verdadeiro eu, mas que lidavam melhor com os sentimentos de auto repulsa. Eu não estava só, não era um monstro, um desvio da natureza. Era diferente. Assim como são diferentes as raças: brancos, negros, ruivos e outros, todas diferentes raças mas uma só espécie - a humana. Devo essa mudança aos meus companheiros de blog, que me ajudaram a ver a realidade existente em mim.
Passei então a questionar quem é quem na alegoria que usei no inicio do post, o médico e o monstro. Sim, porque quem é realmente o verdadeiro eu? Quem é que deve ser reprimido, enjaulado e trancafiado? O homem certinho, “exemplar”, mas transtornado? Ou o monstro impulsivo, sexual e autêntico? Jekill ou Hyde?

p.s. – o nome Hyde parece ser uma analogia ou trocadilho ao verbo em inglês “to hide” (esconder). Achei interessante esse trocadilho, por isso o escolhi como nome do blog: Mr. Hyde ou Sr. Escondido(?).